A campanha invicta do Goiás na Copa Goiás sub-15, principal torneio da categoria infantil no Estado, conta com um personagem inusitado no elenco. Entre vários nomes comuns, tipo Luis Henrique dos Santos, Reginaldo Moreira, Samuel Botelho e Caio Melo, um é que chama atenção: Alex Taruá Karajá. Aos 15 anos de idade, o camisa 19 do tradicional time do Centro-Oeste é índio da tribo Karajá. Ele carrega nome, língua e costumes da vida na aldeia, em “intercâmbio” que não é comum do mundo da bola.
“Eu percebi que ele era um garoto muito bom, finalizava bem com as duas pernas, grande força física e velocidade. Pensei: ‘rapaz, esse menino está perdido aqui’. Tem muitos meninos bons de bola, mas a região é muito longe. Estamos a 1.100 km de Goiânia, tudo distante, afastado, para sair é estrada de chão, uma complicação. Aí ninguém vem olhar”, conta Ricardo Braz, ex-jogador profissional e responsável pela escolinha que descobriu a promessa do Goiás.
Taruá começou a jogar futebol na aldeia, pois boa parte dos Karajá é fã do esporte e organiza campeonatos periódicos – inclusive entre tribos diferentes. Ele não abandonou o hábito quando se mudou com a mãe para a cidade de São Miguel do Araguaia, perto da Aldeia Fontoura, onde foi criado e até hoje seu pai ainda mora.
Há um ano e três meses, o jovem indígena conseguiu bolsa em uma escolinha na cidade e começou a crescer no futebol. Chamou atenção de Braz e, depois, conseguiu o teste na base do Goiás. Aprovado em três dias, assinou vínculo de formação com o clube em setembro e já atuou em duas partidas. Ele ainda não fez gols, mas já tem planos definidos para quando isso rolar.
“Toda vez que eu fizer um gol farei o (gesto) arco e flecha na comemoração. É muito legal para nossa tribo, posso representar o povo indígena do Brasil”, diz o atacante que pretende usar Taruá, seu nome indígena, na camisa de jogo: “Não podemos esquecer da nossa cultura. Temos que levar isso para o resto da vida. Eu vejo direto vídeos de danças deles, ouço músicas, tenho familiares lá. O pessoal ama futebol, até no sol quente eles jogam.”
Os Karajá, segundo o Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (Siasi) da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), são cerca de 4 mil atualmente, nos Estados de Goiás, Tocantins e Mato Grosso. Eles são habitantes seculares do vale do Rio Araguaia, região da Ilha do Bananal, e mesmo com convivência com o homem branco, mantêm tradições, como festas e rituais, pinturas, artesanato e principalmente as línguas nativas, com formas diferentes de falar de acordo até com o sexo de quem fala. Futebol, por exemplo, se fala “aderru”. O próprio jovem jogador tem uma flecha pintada no braço como tatuagem para remeter às origens.
“A mãe dele sempre leva em período de festa, para danças, pintura. Mesmo morando na cidade ele nunca deixou de estar lá. E sempre fala que é muito importante essa coisa da origem, ainda mais se um dia ele mudar de vida mesmo”, conta o descobridor do menino.
As origens de Alex Taruá geram curiosidade entre os companheiros de Goiás. “Me perguntam várias coisas, como é na aldeia, como são os costumes. Eu falo para eles que é bom, mas que é melhor que eles vão lá ver. Acho que isso é bom, sinto que estou representando os índios do Brasil.”
O índio do Goiás é atacante de beirada, gosta de jogar pela direita e procura o drible. É fã de Cristiano Ronaldo e espera fazer carreira no futebol: “Eu estava muito nervoso no começo, mas fui acostumando. É o sonho de todo garoto ser jogador profissional.”