“Aposentadoria dos índios vai acabar”, reclama deputada indígena

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A deputada federal Joênia Wapichana (Rede) durante a 13ª Assembleia Terena (Foto: Paulo Francis)

De roupa simples e chinelos, ela foi exaltada e elevada ao ar por um grupo de indígenas Terena após a dança tradicional da etnia na sexta-feira (10), terceiro dia da 13ª Assembleia Terena na aldeia Ipegue, em Aquidauana, a 135 km de Campo Grande. É Joênia Wapichana, primeira deputada federal indígena do Brasil, eleita pela Rede.

 

Da etnia Wapichana de Roraima, é a nova promessa de defesa dos direitos dos povos indígenas no Congresso. Primeira mulher indígena a exercer a profissão de advogada, ficou famosa pela defesa da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, caso emblemático do STF (Supremo Tribunal Federal).

Ao pisar na Câmara dos Deputados não perdeu tempo. Sua primeira semana já rendeu um projeto de lei para trazer consequências mais graves a crimes ambientais como o de Brumadinho (MG), tornando-os crimes hediondos. 

Atualmente, afirma que o trabalho mais desgastante tem sido na análise do projeto de reforma da previdência, que se diz contrária. Para ela, pouco tem se discutido como a reforma vai atingir os índios, boa parte empregada como trabalhadores rurais. Se a proposta de reforma da Previdência (PEC 6/2019) for aprovada, a idade mínima para aposentadoria dos trabalhadores rurais será de 60 anos para mulheres e homens e o tempo de contribuição será de 20 anos.

“Os indígenas, não sei se estão debatendo, mas essa reforma proposta pelo governo praticamente acaba com a aposentadoria relacionada aos trabalhadores rurais, onde os povos indígenas estão enquadrados”, comenta.

Deputada foi levantada pelos índios Terena (Foto: Paulo Francis)
Deputada foi levantada pelos indígenas Terena (Foto: Paulo Francis)

Machismo e racismo – Depois de Mário Juruna, índio xavante eleito deputado federal em 1982, Joênia é a única parlamentar indígena a colocar os pés no Congresso. É diário, afirma, o enfrentamento ao “machismo, ao classismo e racismo”.

“É um desafio grande, principalmente porque o Congresso Nacional ainda, a maioria, são homens e todo dia nós enfrentamos alguma questão machista, classista e racista, digamos assim, e nós ainda, como mulheres indígenas, temos isso duas ou três vezes penalizadas porque o Congresso não tem maior parte de mulheres”, diz.

Ela analisa que os contextos que a elegeram e elegeram Juruna são completamente diferentes. “Juruna foi uma liderança muito forte, mas teve que sair do estado dele para poder se eleger. O meu processo de eleição foi uma determinação em assembleia, então o povo analisou, fez um debate crítico e tomou uma decisão: ‘está na hora da gente ter o nosso representante”, afirma.

“Está agora mais claro para os povos indígenas que é importante a gente assumir esses espaços políticos”, opina.

Joênia junto ao cacique da aldeia Ipegue (Foto: Paulo Francis)
Joênia junto ao cacique da aldeia Ipegue (Foto: Paulo Francis)

Marco temporal – Foi no julgamento da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol que surgiu, também, o que é hoje considerada, entre os índios, “a maior ameaça jurídicas às demarcações”. É o marco temporal, dispositivo que considera que as terras tradicionais são apenas aquelas que eram efetivamente ocupadas pelos índios na data do publicação da Constituição Federal, em 1988. Joênia classifica como “má fé” e “absurdo”.

“É um mal entendimento, porque a questão da Raposa Serra do Sol não colocou como jurisprudência, então é a própria bancada ruralista que pegou esse ponto dentro do voto do ministro relator Carlos Ayres Britto e colocou ele no auge. E o próprio ministro que tomou o voto já se manifestou que não foi isso que estão interpretando”, diz.

A deputada espera que o marco temporal, que tem se proliferado em tribunais de todo o Brasil, especialmente em Mato Grosso do Sul, seja revertido. “Existe uma má interpretação por parte da ala que conflita com os direitos de terras indígenas e existe já essa má-fé de querer usar o voto de Raposa Serra do Sol para emplacar o entendimento, que ao meu ver é totalmente inconstitucional, imoral, absurdo. Mas a gente vê que estamos vivendo num período nada favorável aos direitos dos povos indígenas e ainda confio muito que pela frente a gente reverter definitivamente esse entendimento, para que não possa ficar novamente uma briga eterna na Justiça”, declarou.

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