Atleta indígena participa neste mês dos Jogos Pan-Americanos de Lima, no Peru

Atleta de tiro com arco desde 2014, Graziela já brincava de arco e flecha quando era criança. Como profissional, agora disputa o Pan pela primeira vez

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Foto: Junio Matos

No final deste mês, mais precisamente no dia 26, os olhos do mundo esportivo estarão voltados aos Jogos Pan-Americanos de Lima, no Peru. Durante os dezessete dias de competições, cerca de 500 atletas vão representar as cores do Brasil – ao todo, a previsão é de que aproximadamente 6.690 atletas de 41 países estejam na capital peruana por conta do evento. Entre tantos personagens, uma é especial. Graziela Paulino, atleta indígena do tiro com arco, será responsável por defender as cores do Amazonas na modalidade.

Dos 23 anos de vida, 17 foram passados na aldeia Kuanã, junto de outras gerações de sua etnia Karapãna. A infância com vasto espaço e natureza ao redor – com o rio Cuieiras passando no quintal de casa – a estimulou a praticar atividades recreativas desde cedo. Antes do profissionalismo no tiro com arco, as brincadeiras no arco e flecha. Embora pareçam semelhantes, possuem diferenças consideráveis que vão dos instrumentos à postura de uso. Os novos termos, técnicas e ferramentas do arco mais sofisticado a fizeram levar um tempo para que se adaptasse totalmente.

O início no tiro com arco

O talento de Graziela foi reconhecido em 2013. Responsável pelo Projeto Arquearia Indígena, o professor Virgílio Viana encaminhou uma caça-talentos para a região da comunidade Nova Canaã, que abrange mais seis aldeias além da Kaunã. Ali, doze jovens foram selecionados para formarem a equipe de tiro com arco do Amazonas, sendo Graziela a única mulher do grupo. A história no esporte, que começara ainda na aldeia quando a atleta somou participações nos Jogos Interculturais Indígenas, foi moldada na Vila Olímpica com os professores Roberval Santos e Aníbal Fortes.

No mesmo ano da convocação para fazer parte da equipe, Graziela iniciou o processo de transição com os professores na Vila. “Ainda em 2013, começamos a passar uma semana em Manaus a cada três meses, fazendo a transição do arco e flecha para o arco olímpico. Tínhamos que ficar lá para concluir as nossas obrigações escolares. Já no ano seguinte, em 2014, passamos a morar de vez na capital, no alojamento da Vila Olímpica”, conta a atleta. Dos doze selecionados inicialmente, Graziela comenta que apenas oito continuaram fazendo parte do projeto em 2014. Hoje, cinco anos depois, a equipe de tiro com arco conta com cinco atletas.

Ponte aérea nos treinos

A vida de atleta que Graziela leva desde 2014 impôs uma nova rotina. Além do fato de morar no alojamento da Vila Olímpica, constantemente, a atleta arruma as malas e viaja rumo à Maricá, no Rio de Janeiro, onde chega a passar de três a quatro meses treinando. Neste ano, esteve de janeiro a maio na cidade, com intervalo para viagem ao Mundial, na Holanda. As temporadas de treinos em terras fluminenses se dão pelo fato de a cidade ser um dos centros da modalidade no país, abrigando a sede da Confederação Brasileira de Tiro com Arco (CBTARCO). 

Na semana que antecede o Pan-Americano, inclusive, Graziela volta a Maricá para os ‘ensaios finais’ antes da competição. “Lá tenho mais uma equipe de suporte. No dia de 22 de julho, vou para treinar antes do Pan e realizar os últimos ajustes antes de viajar. Dependendo de quando for a seletiva para definição da seleção nacional, depois do Pan volto a Maricá novamente e fico até setembro ou novembro. Essa escolha da seleção é importante, porque vai servir para apontar quem são os sete melhores do país”, afirmou Graziela.

Durante a preparação, os equipamentos para a prática do tiro com arco foram disponibilizados à Graziela de maneira dividida. Enquanto as flechas vieram da Confederação Brasileira da modalidade, o arco foi entregue pela Fundação Amazonas Sustentável (FAS), equipe que Graziela representa em torneios nacionais – e que tem como superintendente o professor Virgílio Viana, idealizador do Projeto Arquearia Indígena. Além de bancar as viagens para treinos em Maricá, no Rio de Janeiro, o projeto paga todas as despesas de competições, como passagens e hospedagens.

Talento natural

Inegavelmente, por já ter uma ligação com a modalidade desde criança – através do arco e flecha -, Graziela atingiu o mesmo nível de quem já pratica o tiro com arco há mais tempo com certa facilidade. “Por crescer praticando a atividade desde pequeno, a coordenação motora dos atletas amazonenses é diferente, o que ajuda muito no tiro com arco. Com apenas quatro anos de treinos, chegamos no mesmo nível de quem já pratica há oito, dez anos”, declarou Graziela.

E o currículo da atleta prova que o talento é verdadeiro. Graziela, hoje, é a atual campeã sul-Americana individual e por equipes de tiro com arco. Além desses feitos, com apenas um ano de treinos, em 2014, conquistou a medalha de bronze no Campeonato Brasileiro. No ano seguinte, em 2015, além de repetir a medalha de bronzes, Graziela conquistou a medalha de prata jogando em dupla mista. A lamentar, somente o mau dia no Mundial da Holanda. “Não atirei muito bem no Mundial. Mas entendi que valeu pela experiência. Foi a minha primeira participação no Mundial, então acabei ficando satisfeita”, comentou. A edição deste ano do Campeonato Mundial de Tiro com Arco foi a maior da história, somando quase 450 atletas entre homens e mulheres.  

Agora, o foco está nos Jogos Pan-Americanos, onde Graziela almeja atingir o topo para garantir vaga nas Olimpíadas de Tóquio. O Pan de Lima inicia no dia 26 de julho e vai até o início de agosto, no dia 11. “Estou ansiosa para o Pan. Pretendo ficar entre as quatro melhores e garantir vaga em Tóquio. Além disso, vai valer para a minha experiência”, concluiu. 

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