O marco temporal para demarcação de terras indígenas foi pauta em sessão virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) na última terça-feira (26/5). Entretanto, o ministro Edson Fachin optou por adiar o julgamento da questão – a pedido do ministro Alexandre de Moraes – até que a corte possa retomar os debates presenciais. Uma nova data ainda não foi marcada, o que caberá ao presidente do STF, ministro Dias Toffoli.
Os ministros devem decidir se a data a ser considerada como marco para definir se uma terra era tradicionalmente ocupada por indígenas é a da promulgação da Constituição Federal de 1988. Caso a ddcisão seja favorável ao uso dessa referência, indígenas que não estivessem na terra em questão podem perder o direito de habitá-la. O assunto provoca divergência entre representantes de ambientalistas e do agronegócio.
“Essa proposta não deveria ter razão de existir porque ela fere as disposições da Constituição Federal, fere os direitos originários dos povos indígenas. Não tem o mínimo cabimento você especificar que o povo precisa estar lá na data da promulgação da Constituição. Eles estavam lá há muito mais tempo e foram expulsos, por isso não estavam lá dentro da data proposta”, diz Antonio Oviedo, coordenador do programa de Monitoramento do Instituto Socioambiental.
O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) também é crítico do estabelecimento do marco temporal. De acordo com André Guimarães, diretor-executivo do IPAM, os territórios indígenas têm a importante função de cuidar da Amazônia e, por sua vez, regular o nível de chuvas que possibilita as duas safras brasileiras.
“O Brasil só consegue ter a safra e a safrinha por conta do regime de chuvas, que é proporcionado pela Amazônia e cuidada pelos indígenas. Em torno de 30% do território da Amazônia é território indígena. Quem mais deveria estar defendendo os povos indígenas na Amazônia é o agronegócio brasileiro”, ele afirma.
Marcio Astrini, coordenador geral do Observatório do Clima, ressalta que muitos indígenas estão há algumas décadas esperando pela demarcação de suas terras, mas há morosidade por parte do governo federal. “O mesmo governo que quer passar a boiada e dar à jato terra para grileiros demora a dar terra para populações que estão cobertas pela Constituição”, pondera Astrini.
Outro lado
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) acredita que o marco temporal de 1988 é o referencial “insubstituível” para o reconhecimento de uma área como terra indígena. Além disso, a entidade defende que a demarcação se faz necessária para o gestor público ter clareza e segurança sobre o que é ou não uma terra tradicionalmente ocupada por índios.
“O setor do agro entende essa decisão como muito preocupante e grave, com o potencial de conflagrar o país novamente em conflitos fundiários no setor rural. Pode gerar novamente uma situação que já havia sido superada”, diz o assessor jurídico da CNA, Rodrigo Kaufman, em vídeo institucional.
Já a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) reitera que o marco temporal não significa extinção dos direitos indígenas sobre áreas não demarcadas, mas a implementação do direito de reconhecimento a uma terra indígena.
Ainda assim, a entidade defende que “caso não haja, em pleno século XXI, uma data limite de demarcações, qualquer área do território nacional poderá ser questionada sem nenhum tipo de indenização, inclusive áreas de grandes metrópoles, como Copacabana, no Rio de Janeiro”.