A Fundação Nacional do Índio (Funai) cadastrou dez famílias indígenas que estão aptas a receberem crianças em situação de vulnerabilidade ou que estão em abrigos de Dourados. De acordo com o coordenador da instituição, Fernando de Souza, a proposta é de sugerir essa lista para avaliação da Prefeitura de Dourados, que deve implantar o projeto “Família Acolhedora”, conforme recente recomendação do Ministério Público Estadual.
De acordo com Fernando, a ideia é que quando o município tiver o programa, as famílias da Reserva também possam participar e, com isso, as 50 crianças indígenas que estão espalhadas em entidade acolhedoras de Dourados possam ganhar uma família com as mesmas características culturais. Para isso a Funai também mapeia o parentesco das abrigadas com pessoas da Reserva e que estariam dispostas a adotar. A medida tem a finalidade de impedir a adoção via cadastro nacional por não-indios.
“Queremos trabalhar em parceria com o Judiciário, apresentando uma lista com opções de parentes que podem adotar essas crianças. Há familiares em aldeias próximas ou distantes que estão dispostas a receber essa criança. Já estamos acompanhando todo o processo de destituição familiar para que possamos ir atrás de parentes. A ideia é manter essas crianças nas aldeias para que não percam sua identidade cultural”, destaca o coordenador da Funai, Fernando de Souza.
Segundo ele, esse acolhimento é previsto até que seja possível o retorno à família de origem ou, na sua impossibilidade, o encaminhamento para adoção.
Em novembro do ano passado a Funai realizou o mapeamento de crianças e adolescentes em instituições acolhedoras e constatou que de cerca de 70 crianças existentes em abrigos, pelo menos 50 são indígenas. No Santa Rita, são 28 crianças, no Lar Ebenezer são 8 meninas, no Lar Renascer são 7 e no Instituto Agrícola do menor (Iame) são 7 meninos.
Separação de irmãos
De acordo com a Funai a organização dos acolhimentos em quatro instituições distintas e não integradas tem como resultado a violação de princípios do Serviço de Acolhimento, orientado pelo Ministério do Desenvolvimento Social. Um deles é que devido a organização dos abrigos ser por idade e sexo, existe histórico de separação de irmãos. Atualmente, segundo a Funai existem dois grupos nessa situação, sendo seis irmãos separados em 3 casas de acolhida e outro grupo de quatro irmãos em três abrigos.
Equipe da Funai também constatou um descuido por parte de profissionais que atuam com essas crianças no sentido de verbalizarem impressões preconceituosas acerca dos povos indígenas, principalmente sobre o que é noticiado na imprensa. Também apontam o processo traumático da retirada da criança do convívio familiar para um local totalmente desconhecido, distante e que fale seu idioma.
Para a Funai, quanto mais tempo passa no abrigo a criança esquece costumes, a língua materna, num movimento intitulado pela Funai como estratégia de genocídio, “porque tirar as crianças de um povo também é condenar esse povo a não ter um futuro coletivo”.
Segundo ainda a Funai, dois terços dos indígenas que estão nos abrigos não precisariam estar lá. A instituição alertou ainda que a maioria das famílias que perdem o poder familiar de seus filhos não são orientadas. “É preciso um plano de ação continuada, que assegure o acesso destas famílias à justiça gratuita, em especial às Defensorias Públicas, pois muitos processos ocorrem sem o contraditório, o direito de defesa da família. É fundamental um alinhamento indigenista dos discursos e das práticas de todos os atores responsáveis pela operacionalização do sistema de garantia de direitos, sob pena deste sistema ser mais violador que protetor”, diz relatório.