Por Correio do Estado
O maestro João Carlos Martins não se intimida em afirmar que prefere utilizar toda a atenção que recebe da mídia para valorizar novas orquestras. Em Campo Grande para conhecer mais uma iniciativa na área, o músico acredita ser esse o seu grande legado, “um trabalho de voluntariado, de idealismo”, afirma.
Com o “Orquestrando o Brasil”, projeto de mobilização por meio da música, o maestro e o produtor cultural José Roberto Walker mapearam mais de 500 grupos pelo País, oferecendo capacitação para regentes, músicos, além de divulgação e apoio por meio do portal homônimo. A iniciativa foi lançada em 2018, com o apoio da Fundação Banco do Brasil, do Sesi São Paulo e da Fiesp.
MOBILIZAÇÃO
Em entrevista ao Correio do Estado, o maestro assevera que o projeto diminuiu as fronteiras da música pelo País. “Eu aproveito a mobilização e a exposição da mídia para trazer a atenção do público para os projetos, para as orquestras que existem pelo País. Sempre peço para que essas orquestram mandem seus ensaios para que eu possa assistir e dar a minha opinião, a minha crítica e incluir no nosso site, que hoje é o maior portal de referência da área”, esclarece.
Em Campo Grande, João Carlos Martins conhecerá o trabalho da Orquestra Infantil Indígena de Campo Grande, na Aldeia Indígena Urbana Darci Ribeiro, no Jardim Noroeste. Os pequenos músicos se reúnem desde 2015, por meio de uma parceria entre o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, a Fundação Ueze Zahran e o Comitê Intertribal – Memória e Ciência Indígena – ITC.
“Eu estou muito curioso para conhecer o trabalho dessas crianças. Eu já percorri mais de 100 cidades no Brasil. Em cada cidade, a gente sempre encontra algumas pessoas que são amantes de música clássica, mas poucas que têm a sua própria formação musical. Com algumas orquestras eu mantenho contato sempre, com outras nem tanto, é uma questão de afinidade”, ressalta.
Para ele, as viagens pelo País se assemelham à excursão de Villa-Lobos, em 1931, quando percorreu 54 cidades do interior paulista com a “Caravana de Arte Brasileira”. O que os separa talvez seja a facilidade com que a internet e as redes sociais têm de aproximar os iguais.
“O que eu mais gosto é que nas cidades pequenas há sempre um coreto, mantido através dos anos, e é nesse coreto que costumam acontecer as apresentações”, relembra.
Informado sobre a cidade, João Carlos Martins explica que conhece o trabalho de outro maestro, Eduardo Martinelli. “Quanto mais maestros estiverem unidos nesse exército, mais perto o sonho de Villa-Lobos está de ser realizado, mais próximo o Brasil está de ser em formato de coração”, acredita.
RETORNO AO PIANO
Após 22 anos sem colocar os dez dedos da mão em um piano, em razão de uma doença chamada contratura de Dupuytren, que provoca a contração do músculo e o espessamento da fáscia palmar, João Carlos Martins surpreendeu o público no início de 2020 ao aparecer utilizando uma luva biônica criada especialmente para a função. A prótese desenhada por um admirador, o designer industrial Ubiratan Bizarro Costa, 55 anos, funcionou após a terceira tentativa e permitiu que o maestro voltasse ao posto de pianista.
“Estou começando a estudar como se fosse um menino de oito anos de idade aos 80 anos, estou mostrando que todo mundo pode ter objetivos na vida, não importa a idade”, frisa.
Martins explica que tudo começou como uma brincadeira. “Mas, agora, estou tocando bonitinho”, conta, para completar. “O próximo passo é um robô que será capaz de virar a página das partituras durante as apresentações”.
Com tantas homenagens e biografias – foi tema do filme “João, o Maestro” –, Martins acredita que ainda tem muito a aprender. “Não é o que eu vou ensinar para essas crianças, mas o que elas ensinarão para este velho maestro”, diz.